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Alterações nas regras para emissão de debêntures de infraestrutura e FIP – IE com a edição da Lei 14.801

Em janeiro de 2024, foi editada a Lei nº 14.801 (“Lei 14.801”), regulamentada pelo Decreto nº 11.964 de março do mesmo ano, marcando a criação das debêntures de infraestrutura. Esta nova modalidade de debêntures concede benefício fiscal ao emissor do papel, diferentemente do que foi estabelecido nas debêntures incentivadas, criadas pela Lei 12.431/11, cujo benefício fiscal é concedido ao investidor. A nova lei visa impulsionar o financiamento de projetos considerados prioritários na área de infraestrutura e produção intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação. Além das debêntures de infraestrutura, a Lei 14.801 promoveu alterações ao marco legal das debêntures incentivadas (Lei 12.431), e alterou dispositivos da Lei 11.478/2007 que tratam da tributação dos Fundos de Investimento em Participações em Infraestrutura (“FIP-IE”) e dos Fundos de Investimento em Participação na Produção Econômica Intensiva em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (“FIP-PD&I”).

Debêntures de Infraestrutura

 As debêntures de infraestrutura chegaram ao mercado de forma complementar às já conhecidas “debêntures incentivadas”, criando incentivos tributários ao emissor que, agora, poderá deduzir os juros pagos ou incorridos na apuração do IRPJ e da CSLL. Este benefício fiscal, que visa fomentar a captação para os setores de infraestrutura, possibilita o pagamento de um rendimento maior nas debêntures, gerando maior atratividade para o investimento.

Dentre as novidades que o novo arcabouço regulatório trouxe, ressalta-se: (i) a dispensa de exigência ministerial prévia para projetos dos setores prioritários listados no Decreto nº 11.964, de 26 de março de 2024 (“Decreto 11.964”); porém, projetos que sejam de investimentos em nível de Estados, Distrito Federal e Municípios dependerão de aprovação ministerial prévia via portaria; (ii) o governo poderá autorizar a aquisição das debêntures por pessoa jurídica residente ou domiciliada no exterior, desde que a emissão possua outra emissão-espelho e colocação de títulos no exterior, que sejam a ela relacionados; (iii) ato do poder executivo federal autorizará a emissão das debêntures com cláusula de variação da taxa cambial; e (iv) as debêntures poderão ser emitidas por sociedades controladoras diretas ou indiretas das pessoas jurídicas, desde que constituídas sob a forma de S.A.

Além destas novidades, foi publicada, em 18 de julho de 2024, Portaria nº 689, do Ministério dos Transportes (“Portaria 689”), definindo os critérios de enquadramento dos ativos de infraestrutura de transporte. Consta da referida portaria que serão considerados projetos de investimento aqueles que façam parte do escopo de um contrato de “concessão, subconcessão, permissão, autorização ou arrendamento, ou de seus projetos associados” no setor de transporte. Os recursos captados pela emissão das debêntures devem ser destinados a “ações de implantação, ampliação, aquisição, reposição, manutenção, recuperação, adequação ou modernização de bens de capital, excluídas as ações de conservação”.

O volume financeiro, de acordo com a Portaria 689, não poderá ultrapassar o montante equivalente à realização do projeto, ou seja, não poderá ser parcialmente utilizado para melhoria do fluxo de caixa das companhias, como é comumente feito nas emissões de debêntures sem benefício fiscal, e os recursos deverão ser alocados no pagamento futuro ou no reembolso de gastos – um acréscimo importante na legislação, que não permitia emissão de debêntures por reembolso, a não ser nas debêntures incentivadas.

As debêntures de infraestrutura serão emitidas para financiar despesas ou dívidas relacionadas aos projetos de investimento. A Portaria 689 dispôs que projetos federais ou que envolvam concessão de serviço público de titularidade dos entes subnacionais não serão submetidos à aprovação ministerial; já projetos de investimento subnacionais que envolvam “permissão, autorização, ou arrendamento” dependerão de prévia autorização do Ministério dos Transportes para se enquadrarem. Ainda, houve a inclusão de obrigações relacionadas à emissão de gases de efeito estufa e à transição energética, pontos a serem regulados ainda pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (“ANTT”).

 Debêntures Incentivadas

Com relação às Debêntures Incentivadas, com a edição da Lei 14.801, não será mais necessária a aprovação ministerial para setores que sejam considerados como prioritários no rol estabelecido pela Lei 12.431 e para projetos que sejam considerados como prioritários na forma regulamentada pelo Poder Executivo federal; o prazo para reembolso de despesas incorridas com o projeto passou de 24 para 60 meses, a partir do encerramento da oferta pública das debêntures, e também será permitida a emissão desses valores mobiliários com cláusula de variação cambial, o que, até então, era vedado.

 Aplicação das novas regras a cotistas de FIP-IE e FIP-PD&I

Vale ressaltar, na seara tributária, ficou finalmente positivado que as regras concernentes à aplicação da alíquota zero de IRRF nas aplicações de investidor não residente são, também, aplicáveis aos cotistas residentes ou domiciliados no exterior dos fundos previstos na Lei 11.478, que instituiu o FIP-IE e o FIP-PD&I, que era uma lacuna da lei até então em vigor.

Além disso, passam a ser considerados como ativos elegíveis dos FIP-IE e FIP PD&I a expansão de projetos já existentes, implantados ou em processo de implantação, desde que os investimentos e os resultados da expansão sejam segregados mediante a constituição de sociedade de propósito específico ou sejam implantados por sociedade de propósito específico já constituída em razão de celebração de contrato de concessão, permissão, arrendamento ou autorização de empresa com entidade pública.

O Decreto 11.964, que regulamentou os critérios e as condições para o enquadramento e acompanhamento dos projetos de investimento considerados como prioritários na área de infraestrutura ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação para fins da emissão de debêntures incentivadas, de infraestrutura e ativos elegíveis para os FIP-IE e FIP PD&I, criou um rol taxativo e exclusivo para a definição de ativo de infraestrutura de cada setor mencionado no artigo 4º do referido Decreto, que regulamentou o artigo 1º, § 2º da Lei 11.478.

Passaram, então, a serem incluídas as áreas consideradas como prioritárias pelo Poder Executivo Federal, na forma das Leis 12.431 e 11.478, além daquelas que possuem rol taxativo no Decreto 11.964 como as áreas de energia, transporte, água e saneamento, e irrigação, com especial destaque para a área de energia, em que houve a busca pela inclusão de setores da matriz energética limpa e fontes renováveis, incluindo o biogás e fontes de energia mais sustentáveis (tais como os combustíveis sintéticos com baixa intensidade de carbono) e deixando de fora os combustíveis fósseis.

Além das questões de enquadramento de ativos e ambiental, houve uma extensão do prazo de operacionalização destes tipos de FIP, que passa de 180 para 360 dias, contados do registro de funcionamento concedido pela CVM, com extensão, também, do prazo de enquadramento, sendo atendidos os requisitos mínimos em 24 meses (prazo era de 180 dias na previsão anterior à edição da Lei 14.801).

Entendemos que as mudanças trazidas pela Lei 14.801 são benéficas para o mercado, já que estabelece novo tipo de ativo para captação de recursos, além de esclarecer pontos obscuros da legislação até então em vigor. Entretanto, e tal como feito pelo Ministério dos Transportes, é necessário que os demais ministérios promulguem as portarias necessárias para que as debêntures de infraestrutura possam ser emitidas com menos riscos jurídicos.

Gabriel Sollero Figueira – Sócio Project Finance e Mercado de Capitais

Marcello Bertoni – Sócio Tributário

Felipe Gouvêa – Associado Sr. Project Finance e Mercado de Capitais

Fontes:

Anbima Data. Boletim de Debêntures Incentivadas e de Infraestrutura: data.anbima, 2024. Disponível em: https://data.anbima.com.br/publicacoes/boletim-de-debentures-incentivadas-e-de-infraestrutura. Acesso em: 17/07/2024.        

BRASIL. Lei nº 14.801, de 09 de janeiro de 2024. Dispõe sobre as debêntures de infraestrutura; altera as Leis nºs 9.481, de 13 de agosto de 199711.478, de 29 de maio de 2007, e 12.431, de 24 de junho de 2011; e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 de janeiro de 2024. Seção 1, páginas 1-2.

BRASIL. Lei nº 11.478, de 29 de maio de 2007. Institui o Fundo de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE) e o Fundo de Investimento em Participação na Produção Econômica Intensiva em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (FIP-PD&I) e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 30 de maio de 2007. Seção 1, página 2.

BRASIL. Resolução CVM nº 175, de 23 de dezembro de 2022 com as alterações introduzidas pelas Resoluções CVM nº 181/23, 184/23, 187/23 e 200/24. Dispõe sobre a constituição, o funcionamento e a divulgação de informações dos fundos de investimento, bem como sobre a prestação de serviços para os fundos, e revoga as normas que especifica. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 28 de dezembro de 2022. Seção 1, página 1-2.

Capital Aberto. Ministério dos Transportes publica portaria regulamentando emissão de debêntures: Capital Aberto, 2024. Disponível em: https://capitalaberto.com.br/regulamentacao/ministerio-dos-transportes-regulamentando-emissao-de-debentures/?utm_campaign=destaque_02_do_dia_1807_base_geral. Acesso em: 17/07/2024.

Valor Econômico. Exclusivo: Conheça os principais pontos do decreto das debêntures de infraestrutura. Valor Econômico, 2024. Disponível em: https://valor.globo.com/financas/noticia/2024/03/26/exclusivo-conheca-os-principais-pontos-do-decreto-das-debentures-de-infraestrutura.ghtml. Acesso em: 17/07/2024.